O mercado financeiro brasileiro foi surpreendido nesta sexta-feira (29) com o dólar atingindo a marca inédita de R$ 6,10 no mercado à vista. O aumento reflete o mau humor dos investidores diante das recentes medidas fiscais anunciadas pelo ministro da Fazenda, Fernando Haddad, e detalhadas na última quinta-feira (28).
As medidas, que incluem a ampliação da faixa de isenção do Imposto de Renda (IR) para salários de até R$ 5 mil, foram criticadas por economistas e investidores, que apontam riscos ao equilíbrio fiscal. Segundo a consultoria Warren Investimentos, a economia projetada pelo governo de R$ 71,9 bilhões seria otimista, estimando que o montante real seria de apenas 62% do esperado, cerca de R$ 45 bilhões. Já o Itaú Unibanco projeta uma economia ainda menor, na casa dos R$ 53 bilhões, mas distribuída entre 2025 e 2026.
Reação negativa do mercado
A ampliação da isenção do IR foi a principal medida a gerar desconfiança. Especialistas apontam que, embora beneficie contribuintes que ganham até R$ 5 mil, a proposta compromete o arcabouço fiscal e pode gerar um impacto econômico de R$ 45,8 bilhões, segundo cálculos da Warren Investimentos. Além disso, a consultoria Tendências destaca que apenas 15% da população brasileira permaneceria na base de cobrança do imposto, reduzindo drasticamente a arrecadação federal.
Em contrapartida, o governo propôs maior taxação para pessoas com rendimentos acima de R$ 50 mil mensais, em uma tentativa de compensar a perda de receita. Ainda assim, o mercado considera as medidas frágeis e insuficientes para sustentar um equilíbrio fiscal robusto.
Críticas e respostas políticas
Enquanto economistas criticam a inconsistência das medidas, o ministro da Casa Civil, Rui Costa, atribuiu a alta do dólar ao Banco Central. Ele reforçou que o governo está comprometido em explicar o pacote fiscal e que a cotação deve recuar.
“Estamos em contagem regressiva para ter não um Banco Central que seja com olhar para o Executivo, mas um Banco Central que tenha um olhar para o Brasil”, declarou Rui Costa.
Apesar disso, a percepção predominante entre investidores é de que as decisões fiscais recentes ampliaram a instabilidade econômica, agravando a desvalorização do real.
Contexto histórico e contraste político
A alta de R$ 6,10 marca o maior valor do dólar em toda a história do Plano Real, instaurado em 1994. O recorde, registrado durante o terceiro mandato do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), contrasta com as críticas feitas pelo partido ao governo Bolsonaro em 2019, quando a moeda americana chegou a R$ 4,26. À época, o PT culpou a “incapacidade de gestão” de Bolsonaro pelo desempenho cambial.
Agora, em um contexto de reação desfavorável às políticas do próprio governo, o PT enfrenta dificuldades para estabilizar a economia e reconquistar a confiança do mercado.
Perspectivas econômicas
Analistas indicam que o cenário cambial reflete mais do que a aversão pontual às propostas fiscais. Ele é sintoma de uma crise de confiança mais ampla entre investidores e gestores financeiros, preocupados com a viabilidade econômica a longo prazo.
Embora o governo tente sustentar o discurso de que as medidas beneficiarão a classe média e redistribuirão a carga tributária, o mercado financeiro exige maior clareza e comprometimento com a responsabilidade fiscal para evitar que a volatilidade do dólar e os impactos inflacionários prejudiquem ainda mais a economia brasileira.